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"Na vida quem perde o telhado em troca recebe as estrelas"
Tom Zé



quinta-feira, 18 de março de 2010

Encontro com novos artistas





Por motivos técnicos, a Cia Parati desmembrou-se em dois grupos, esse foi um momento de aprendizado e de maior autonomia na possibilidade do jogo do palhaço.


Eu (Rafael) e Felipe nos jogamos nas ruas com números de malabares e acrobacia, sem contar com os bofetões e tropeços do palhaço! Dessa relação, surgiu a necessidade de ter um Branco no comando (Zuza) e um Augusto (Gaiato), isso proporcionou uma identificação maior com a platéia e nos auxiliou a estruturar melhor a cena a ser montada.

No decorrer dos dias, agregamos outros artistas que estavam nos arredores de Pernambuco, conhecemos um casal de italianos: Vincent (o palhaço) e Ticiana. Certa manhã na praça, estavamos treinando segunda altura e malabares, quando o palhaço nos apresentou três esquetes: o atirador de facas, o palhaço Bêbado e o palhaço que tem fome. As marcas da sua trajetória proporcionaram uma vontade maior de viver a mascara do palhaço. Partiram antes do carnaval, nos deixando como lição a verdadeira entrega do palhaço na ação e relação, assim como arriscar a levar essa arte para outros lugares, sugerindo: “Torino” na Itália.






Um dia no final do expediente, quando íamos trocar nosso amontoado de moedas no mercado, conhecemos o Ramiro, malabarista argentino com alma de palhaço! Desde então criamos uma relação e decidimos ensaiar números no parque Treze de Maio, não tardou muito e já estávamos nas ruas, ele com seu monociclo girafa, Zuza com sua rabeca e eu com as claves no ar!


Em meio ao fervor do carnaval multicultural, conhecemos Agathe, uma francesa de excelência e excêntrica por natureza, carregava em suas mãos um fantoche e um nariz de palhaço dependurado, não tardou e lá estávamos de novo, juntos trabalhando... Grezza (Agathe) participou de duas rodas com todos da Cia Parati e depois ficou com a dupla Zuza e Gaiato.

Dias depois traçamos um roteiro, enquanto os outros palhaços iam dar pé na estrada para o sertão, decidimos chegar a Porto de Galinhas, saímos eu e Agathe, juntos de mais nove artistas circenses, dentre eles argentino, colombiano e chileno!



>Chegamos a Maracaípe, a 75 km de Recife, lugar paradisíaco, rico em reservas ambientais e muito mangue.


Trabalhei com a palhaça Grezza alguns esquetes clássicos e experimentamos fazer estátua viva (eu de Olivia Palito e ela de Popaye), conseguimos abrir roda no centro de Porto, foi incrível compartilhar das dificuldades com uma pessoa que trás outras referências em relação a linhagem do palhaço.

Dois dias depois Felipe chegou, trabalhamos mais uns dias abrindo roda e voltamos para Recife para encontrar com mais um integrante que acabara de chegar de um cruzeiro: o Palmery- palhaço Piriri Manquetola!

Agathe voltou para Salvador, Ramiro rumo a Venezuela e México, enquanto Felipe e Anderson estavam na Paraíba, trabalhamos por aqui com a Tâmara e o Palmery, abrindo uma roda no Parque da Jaqueira que deu no que falar...

Rafael Napoli

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Sertão

- “A época do caju chegou.
A época do caju foi embora.
Você não apareceu.
Chorei pensando que não vinha mais.”

Estou em Recife desde o primeiro dia do ano. Vi a maré encher e a maré baixar por vezes incontáveis, vi a cidade toda começar a se enfeitar para o carnaval, encontrei amigos inesperados e amigos que eu estava cheia de saudade no peito, vi e vivi muitas coisas e dentre essas coisas vi também a Cia Parati pousar nessa cidade que é metade de mim. Entre se adaptar, arrumar, encontrar e caminhar, num dia inesperado eu estava ali, no meio da ‘companhia’ abrindo uma roda no Parque da Jaqueira. Nada combinado: Aconteceu.
Passei a ser uma integrante temporária: Toda inteira, com meu figurino diferente , destoando, desequilibrando, mas junto.



Nos tempos livres, de cara limpa, íamos juntos repensando e refazendo coisas, adaptando, inventando. Ficamos todos os cinco juntos? Qual o desejo de cada um? E se nos separássemos? Pronto!
São dois pra lá e dois pra cá, igual valsa, mas num desses dois cabe mais um: Que era eu.
Divididos e juntos.
Gaiato e Zuza.
Cavaco, Tamis Liudis e Severina.
Fomos para a vida, com a cara (pintada) e a coragem. Era um recomeço para eles e um começão para mim. Aonde tudo isso ia dar?



Em Boa Viagem, aquele casal do prédio ao lado da Praça:
“Vimos da Janela que vocês tinham chegado e descemos correndo. Agora vamos para casa ver o fim da ‘Fazenda’.”



No Parque da Jaqueira, o segurança que para sua ronda e fica sorrindo escondido, depois disfarçadamente continua seu trabalho como se não tivesse encontrado nenhum palhaço no caminho.



E chegou o grande dia! O dia que por mais de um ano, é por mim, o dia mais esperado.
A travessia até o sertão.
De Recife a Buíque.
Com nossas malas e corações partimos.
Marília no volante. Amiga querida, fotógrafa, palhaça de alma.
Primeira parada: Feira de Caruaru. Para uma possível roda que não aconteceu. Pouca gente, muito sol. Almoçamos na casa da Marília, e eu, cai doente. Febre mais quente que o sol, frio que não se sente por aqui. Dormi por duas horas, era preciso partir. Saímos em direção a Pesqueira, cidade que onde mora meu pai.



Com a noite chegando chegamos a Pesqueira, a última cidade do Agreste. Eu, e minha ressaca de febre, não agüentei sair de casa, fui dormir enquanto Anderson, Tâmara e Marília foram desbravar a cidade.


Eles fizeram uma roda e foram até dar uma entrevista na Rádio Comunitária Urubá, isso fiquei sabendo meio sonolenta, quando voltaram para casa.
No dia seguinte, bem cedo, nos arrumamos e enquanto colocávamos nossas bugigangas no carro as crianças da rua da casa do meu pai (no Bairro Central) começaram aparecer. Muitas.



Combinamos com elas que dali uma hora aconteceria uma brincadeira por ali. Fomos para o centro da cidade, demos uma volta pela feira e seguimos para a Praça Jurandir de Brito, Tamis Liudis conseguiu uma carona e nós fomos a pé.



Abrimos uma roda para as pessoas que ficam esperando a Toyota para levá-las de volta ao sítio.



De volta ao Bairro Central meu coração quase parou. As crianças que nos abordaram assim que amanheceu o dia estavam nos esperando na rua, e a maioria delas com o nariz pintado de vermelho, esperando a brincadeira.



O sol já estava de rachar o coco do Palhaço. Em busca de uma sombra encontramos um beco, com uma faixa de sombra, onde as crianças cabiam. E simbora brincar.


Meu coração ficou repleto de alegria, de repente tudo passou a fazer mais sentido do que nunca. A brincadeira só acabou porque Tamis Liudis ficou nervosa e quando fica desse jeito ela não para de soltar pum. Todo mundo correu para se proteger, cada um escondido em sua casa e Tamis Liudis direto para o banheiro.
Coração na mão seguimos em direção ao nosso destino final: Buíque – Vale do Catimbau.
Depois de 1 hora e meia de viagem encontramos a estrada de terra que nos levaria ao Vale... Eu tremia toda. Por quê?
Sim... Em Janeiro do ano passado estive por lá, de cara limpa, para conhecer e encontrar. Fiz dois grandes amigos: Lomé, guia da Reserva do Vale do Catimbau fazedor de mel e Irma de oito anos. Irma foi a melhor companhia no tempo que estive por lá e antes de minha partida me levou ao Cajueiro e me entupiu de caju. Disse a ela que voltaria para o ano.
Voltei exatamente do jeito que queria: Para brincar!
Os 20 km da estrada de terra pareciam não ter fim. Enfim, chegamos.
Corri para ver Irma e quando nos encontramos foi só sorriso e abraço.
- A época do caju chegou. A época do caju foi embora. Você não apareceu. Chorei pensando que não vinha mais.
Não pude dizer nada.
Na parede da casa dela tem pendurada uma foto da Severina que Marília deu de presente a ela quando esteve por lá no Inverno passado.
Passamos a tarde toda juntas, com Marília, Jamile e Lívia também. A brincadeira já tinha começado. E a tarde voou, o sol se acalmava na beira do céu quando Cavaco, Tamis Liudis e Severina saíram para chamar as pessoas até a praça.



Brincamos até a noite cair e tudo ficar bem escuro. As crianças se manifestavam em cada gesto, cada tropeço, cada tapa e nós nos divertíamos tanto quanto elas.



E com a noite nos mandando para casa nossa travessia terminou. Aos poucos e demoradamente as crianças foram voltando para as suas casas. Irma me abraçou com os olhos de lágrimas e levou embora com ela um pedaço grande de mim. Fiquei em silêncio até perder de vista, dentro de mim era um turbilhão. Ali, nas areias do Vale do Catimbau encontrei a mim, o meu caminho, senti a maior alegria que nunca senti e nem sei explicar porque era a soma de tudo de mim, e foi assim, com meu coração repleto de amor que terminou meu ciclo com a Cia Parati.
Obrigada por essa parceria e por essa travessia que juntos fizemos.



Caroline Severiano

quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

FOI CARNAVAL!!!

Vivênciamos aqui o Carnaval multi cultural de Recife, o maior do planeta, e bota multi cultural nisso, uma grandeza que nós não tínhamos noção. Muita gente na folia e uma diversidade na programação que nos deixava confusos na escolha do que fazer. Tinha bloco de maracatu, frevo, caboclinho, trio elétrico, coco, sem falar na quantidade de shows musicais espalhados em vários palcos pela cidade, Lenine, Cordel de Fogo Encantado, Otto, Zé Ramalho e muito mais artistas musicaram a cidade toda durante os cinco dias de festa. E o palhaço? Onde entra nisso?
Pois é, não foi fácil, pelo menos com os nossos espetáculos de rua tivemos que ficar fugindo dos blocos já que era impossível disputar a atenção com eles. AInda bem que na terça-feira de carnaval fomos "iluminados" e conseguimos um bom espaço para apresentarmos, foi uma grande experiência estar no meio do carnaval fazendo nosso trabalho. Só de lembrar daquela plateia toda fantasiada nos rodeando, sinto até um carinho no coração.
Participamos também do bloco do "Miolo Mole", que é composto pelos palhaços do elenco dos Doutores da Alegria aqui de Recife. Fomos convidados e lá estávamos com mais outros tantos palhaços e foliões. Tivemos bons momentos, jogamos com outros palhaços, vimos os pais brincando com os filhos, gente que estava na rua entrando para o bloco e até médico de verdade tirando o dia para palhaçar. Tudo isso ao som de um orquestra de metais. O cortejo então foi encerrado com o "maracalhaço", um maracatu feito pelos palhaços doutores, onde nossa amiga Tamis Liudis também entrou na roda para tocar o afoxé. Confesso que não foi fácil manter o estado durante as 4 horas de intervenção, mais depois de muitos tropeços, escorregões e pernas moles consegui chegar até aqui para contar essa história. Muita lembrança, muito aprendizado e muitas fotos bonitas registradas nas nossas cabeças, já que essa postagem vai sem foto nenhuma!

Anderson Machado

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Encontros


Podemos dizer que o trabalho aqui em Recife demorou alguns dias para "entrar nos eixos" pois encontrar um local apropriado para o grupo se apresentar não foi uma tarefa fácil. Depois de algumas tentativas sem sucesso (por espaço não compatível ou por falta de público) descobrimos a praça da igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem. Um lugar bonito onde as pessoas passeiam de noite pela feira de artesanato e aproveitam para comer uma tapioca com os filhos. A praça conta com uma estrutura de teatro arena que quando vimos ficamos aliviados.
Em nosso terceiro dia de apresentação nessa praça após nossa primeira sessão fizemos o intervalo de costume antes da segunda. Neste meio tempo conhecemos o ator Helio Vicente que se apresenta nesta mesma praça com a sua personagem Gerusa Perna Fina. Conversamos muito sobre o trabalho do artista de rua, como dividir o espaço com outros artistas, passagem do chapéu, formação de plateia, outras possibilidades de lugares para apresentarmos, etc. Foi uma boa conversa mas melhor ainda foi ve-lo em cena. Sua personagem vai se montando no centro da roda e durante todo o tempo Gerusa interage diretamente com a platéia. Em poucos minutos uma roda de 360° é formada a sua volta. Seu estilo de comédia é verborrágico, e aborda temas do cotidiano da mulher, como sexo, brigas conjugais, menstruação, educação dos filhos, etc. Tudo isso combinado com um bom trabalho corporal e um bocado de palavrões, que ao meu ver não faz com que a qualidade de sua apresentação diminua. Nós da CiA PaRAtI ficamos contentes em ver um formato diferente de espetáculo de rua. Muito mais contentes ficamos quando fomos surpreendidos por Gerusa nos chamando no centro da roda: -" Pessoal, não vão embora, tenho o prazer de chamar aqui meu amigos palhaços paulistas" - Levantamos meio desconcertados mais fomos, a roda estava feita, grande como nunca. Um minuto de aquecimento e pronto, tonus no corpo, estado de alerta e do mais se "virando" para as pessoas que estão na frente, nos lados e nas costas. Todos merecedores do nosso olhar.
Valeu Gerusa Perna Fina e um viva pra roda de 360°.

Tâmara Lima

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Cia Parati chega em Recife

Finalmente chegamos. Nossa idéia inicial era a de seguir pelo litoral brasileiro conhecendo as cidades a bordo do nosso carro, a Parati, mas ouvindo as histórias sobre os perigos das estradas e levando em consideração a idade da Parati (um carro nascido em 1990) resolvemos juntar uma parte do dinheiro que fizemos e vir voando para cá, assim economizamos 3 dias de viagem e ganhamos mais dias para trabalhar. Aqui encontramos com Caroline, grande amiga artista que foi da nossa turma da formação de palhaços. Agilizou nossa estadia por aqui e nos apresentou grandes belezas da cidade.



Domingo (31/01) foi o nosso primeiro dia de trabalho. Fomos para o centro antigo da cidade, um lugar muito bonito que contem muita história, uma arquitetura rústica e ruas super decoradas ao clima do carnaval Pernambucano. Apesar do frio na barriga por ser um lugar totalmente diferente de Paraty no Rio de Janeiro, conseguimos respirar fundo e nos divertir no meio da roda de 360° graus que se formou a nossa volta.




O público então... Muito caloroso, alguns chegavam com o olhar desconfiado, mas logo se rendiam a diversão: Crianças, velhinhos, gaúchos, paraíbanos, pernambucanos, ricos e pobres. Foi um encontro de boas vindas que terminou no auge com um Pernambucano arretado dançando frevo no centro da roda ao som do cavaquinho.




Apos o expediente fomos conhecer os blocos carnavalescos da cidade que já está "frevendo". Coisa linda de ver a banda de metais, a bateria, as rodas que se abriam para as pessoas dançarem o frevo e o bloco da saudade com belas senhoras fantasiadas dançando e cirandando. Cenas que emocionam, ver a paixão do povo que espera o ano todo por essa data, o carnaval.

Anderson Machado

O fim do primeiro ciclo

Hoje dia 26 de Janeiro Podemos dizer que o nosso ciclo em Paraty foi encerrado e estamos satisfeitos. Chegamos com a cara e a coragem sem saber direito o que fazer e como "se virar". Começamos dia 29 de Dezembro tirando fotos com os turistas, vendendo flores e fazendo estátua viva cômica pelo centro histórico da cidade. Gradativamente os números de palhaço foram evolouindo e assim nossa roda foi se estruturando com os 4 Palhaços juntos, sendo que no início da viagem éramos em 5, nosso amigo Adonai participou dessa vivência mais voltou para São Paulo dia 7 de Janeiro pois tinha que trabalhar por lá.
Nossa cominhada não foi fácil. A convivência de 24 horas por dia entre os integrantes passou por momentos conturbados mas também ganhamos experiências muito prazerosas. É uma verdadeira escola de como conviver em grupo, tratar bem o ser humano, respeitar o tempo de cada um e tudo mais. Nosso presente era poder trocar reflexões, discutir respeitosamente e poder se olhar durante as apresentações e sentir que "estamos juntos".


Vamos embora mas deixamos muitos sorrisos espalhados, muitas fotos que registraram belos encontros, amigos que foram anjos em nossas caminhadas, nos orientaram e nos motivaram a continuar. Gente de diversos países, o que nos prova que o Palhaço é universal e até nos instiga a conhecer outros lugares. Parte do nosso coração fica em Paraty, na vontade de um dia voltar e na alegria de ter vivido intensamente essa experiência de rua com nosso ofício de paixão, podendo, em todos os sentidos, nos sustentar.

Anderson Machado